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 Setembro Azul

“É preciso que se acabe com o preconceito de que surdo não é capaz. Precisamos ser respeitados como pessoas capazes de vencer”, destaca professora

Waléria Corcino de Oliveira, que é surda, ministra Libras para alunos ouvintes no Câmpus Goiânia

  • Publicado: Sexta, 28 de Setembro de 2018, 16h42
  • Última atualização em Quarta, 17 de Outubro de 2018, 16h40
Professora surda Waléria Corcino de Oliveira ministra Libras para alunos dos cursos superiores no Câmpus Goiânia
Professora surda Waléria Corcino de Oliveira ministra Libras para alunos dos cursos superiores no Câmpus Goiânia

Setembro é um mês marcado por importantes ações de atenção à vida e à inclusão em todo país. Além da campanha Setembro Amarelo de prevenção ao suicídio, neste mês destaca-se também a campanha Setembro Azul, que marca o movimento da comunidade surda, celebrado especialmente no dia 26 de setembro, quando se comemora o Dia Nacional dos Surdos. No Câmpus Goiânia do Instituto Federal de Goiás (IFG), a professora Waléria Corcino de Oliveira, que é surda e ministra a Língua Brasileira de Sinais (Libras) para alunos ouvintes dos cursos superiores, é um desses exemplos que nos fazem refletir sobre a responsabilidade de fazer uma instituição e sociedade inclusivas também para os surdos enquanto uma tarefa cotidiana e importante.

“Para que haja a verdadeira inclusão, nós, surdos, precisamos ser respeitados como pessoas capazes de vencer. O que precisamos é compreender e ser compreendidos que queremos nos comunicar uns com os outros, mesmo com a presença do intérprete de Libras, que muitas vezes não temos. Eu convido a todos a aprender a Língua da pessoa surda - a Libras”, ressalta a professora Waléria Corcino de Oliveira.

A professora Waléria Corcino de Oliveira, 28 anos, atua como docente substituta no Câmpus Goiânia. Até chegar à docência, foram vários os desafios pessoais e profissionais enfrentados pela professora. Waléria não nasceu surda, mas se tornou em virtude de sequelas de uma meningite que a acometeu quando tinha um ano e oito meses. Desde então, não só a vida da professora foi modificada pela surdez, como também a de seus pais, como narra a mãe da professora, a senhora Wuelta Coeles de Oliveira.

“As sequelas da meningite não fizeram com que a Waléria desanimasse e nem a nós também. Ela sempre teve muita força e foi uma criança muito esperta. Aos quatro anos, foi para escola, sempre muito esforçada e, ao terminar o ensino médio, ela resolveu cursar uma faculdade. Nós enfrentamos com ela vários obstáculos, a dificuldade de aceitação na faculdade, a dificuldade de ter um intérprete de Libras. Eu me senti na obrigação de me capacitar e me tornar também uma intérprete da Waléria”, conta a mãe da professora.

O ingresso na universidade não foi fácil, recorda a professora Waléria: “Meu maior desafio foi o Enem, que não era preparado para pessoas surdas. Tive que fazer a prova toda na língua portuguesa, não existia adaptação para pessoas surdas, ou seja, nada em Libras. Outro desafio foi querer fazer o vestibular para Veterinária, pois adoro animais e não podia, porque sou surda. Mas agora já temos a adaptação da prova em Libras”.

Professora Waléria de Oliveira e sua mãe, Wuelta de Oliveira.
Professora Waléria de Oliveira e sua mãe, Wuelta de Oliveira.

 

A mãe de Waléria e professora, Wuelta de Oliveira, ajudou a filha na preparação para o vestibular de Letras - Libras na Universidade Federal de Goiás (UFG). Segundo a professora Waléria, a graduação foi uma escolha motivada pelo desejo de ensinar pessoas surdas a conhecerem a Língua Portuguesa e ensinar também a Libras aos ouvintes. Apesar de serem línguas nacionais, a Libras e a Língua Portuguesa são distintas, sendo que a primeira possui uma gramática e regionalismos próprios.

Superados os desafios na graduação, os estudos da professora Waléria não pararam. Ela é especialista em Neuropedagogia aplicada à educação pela Faculdade Brasileira de Educação e Cultura (Fabec) e também em Linguística das Línguas de Sinais pela UFG. Logo após a formação acadêmica, veio o desejo pela superação de barreiras também na carreira profissional e pelo primeiro emprego. A professora Waléria começou lecionando no Centro de Capacitação Profissional da Educação e de Atendimento a Pessoas com Surdez, onde também atua até hoje. Posteriormente prestou uma seleção para trabalhar como docente de Libras no IFG - Câmpus Goiânia, tendo sido aprovada como professora substituta na unidade desde junho do ano passado.

Para o futuro, os planos da professora Waléria são ainda maiores. “Entrar no Mestrado para que eu possa ter mais conhecimento na Linguística em Libras, para poder ensinar crianças surdas, adolescentes surdos e ouvintes, para que possam ter um melhor contato com os surdos e para que cresçam com um futuro melhor. Quero conseguir passar num concurso federal e ser realmente concursada. E ir em busca do meu doutorado com foco em língua de sinais.”, vislumbra a professora.

 

Ensino da Libras

Deparar-se com uma sala cheia de alunos ouvintes com uma professora surda ministrando uma aula, sem ajuda de um intérprete, dá até para duvidar de que é possível ensinar e aprender num ambiente assim, já que não há voz, um atributo tão fundamental para os docentes. Os próprios estudantes afirmam que isso causa uma certa apreensão no primeiro momento, mas que logo o susto é superado pela curiosidade e vontade em aprender Libras.

Alunos atentos às aulas de Libras ministradas pelas professora Waléria de Oliveira.
Alunos atentos às aulas de Libras ministradas pela professora Waléria de Oliveira.

 

Para a estudante de licenciatura em Física do IFG – Câmpus Goiânia, Marillya Alves Borges, o estudo da Libras deveria ser obrigatório para todos os cursos. “Aprender Libras é essencial para comunicação com todos, essa igualdade que a gente precisa ter. E mesmo se não tivesse Libras na faculdade, meu intuito seria procurar o curso de Libras para poder fazer .” Sobre as aulas ministradas pela professora Waléria, a aluna Marillya conta que inicialmente ficou assustada ao pensar como a professora iria conseguir se comunicar com a turma. “É inexplicável, mas a gente consegue se comunicar com ela. Eu já consigo fazer perguntas para ela usando a língua brasileira de sinais”, afirma Marillya.

A limitação em sala de aula é superada pela professora Waléria com louvor, mantendo a turma bem atenta e utilizando métodos e tecnologias para superar as barreiras na comunicação entre docente e estudantes.“Um dos métodos mais importante é o uso da data show, porque preparo minha aula toda em slides, usando muitas imagens para que os alunos entendam a aula. Uso muitas dinâmicas em Libras, que ajudam na aprendizagem do ouvinte. Filme e vídeos feitos por mim e atividades com fotos minhas usando os sinais e muitos outros recursos. É maravilhoso, porque os alunos ouvintes têm muita vontade de aprender Libras. Quando eu ensino, eles ficam prestando muita atenção. E quando ensino, tenho a certeza que os ouvintes vão conseguir comunicar com as pessoas surdas e fico muito feliz com o apoio dos alunos ouvintes”.

A respeito da importância da campanha Setembro Azul, a professora Waléria ressalta que este mês representa a luta da pessoa surda num momento histórico de sofrimento e até proibição do uso da Libras no passado. E conclama que esse movimento em defesa das pessoas surdas não se restrinja apenas a um mês, mas que a inclusão ocorra todos os dias.

Professora Waléria de Oliveira e o intérprete de Libras, Leone Xavier, o qual nos ajudou a comunicar com a docente para essa reportagem.
Professora Waléria de Oliveira e o intérprete de Libras, Leone Xavier, o qual nos ajudou a comunicar com a docente para essa reportagem.

 

 

Coordenação de Comunicação Social do Câmpus Goiânia 

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