Audiência Pública retoma debates sobre projeto de canalização do Córrego Joséfa Gomes
Apanhado de informações e explicações técnicas de especialistas sobre a canalização do córrego e seus efeitos informam, promovendo esclarecimento da população
Encerrando as atividades da II Semana Nacional do Meio Ambiente do IFG, que foram propostas a partir de uma problemática formosense – a canalização do Córrego Joséfa Gomes -, a Audiência Pública das Instituições de Ensino, Pesquisa e Extensão sobre o tema trouxe participantes de gabarito para as discussões acerca do assunto.
A atividade foi realizada às 19 horas da última quarta-feira, 8 de junho, no Teatro Guaiá do Câmpus Formosa do Instituto Federal de Goiás, e contou com representantes do Câmpus, de outras instituições de ensino e da promotoria pública. Formaram a mesa diretiva, o botânico do Câmpus Formosa, professor Marcos Augusto Schliewe; o pesquisador do Observatório das Dinâmicas Socioambientais (ODISSEIA), Elton Souza Oliveira; o geógrafo da Universidade Estadual de Goiás (UEG), professor Wilson Lopes Mendonça Neto; e o promotor da 2ª Promotoria de Justiça de Formosa, Ramiro C. Martins Neto.
“Ligou o sinal vermelho. Esse córrego corre perigo com essa obra, corre perigo de acabar e, consequentemente, a Lagoa Feia e o meio ambiente da nossa cidade”, alertou Schliewe.
Para o público, composto por estudantes, docentes, convidados e visitantes, o mediador, professor Oberdan Quintino de Ataídes, justificou a realização da audiência e do próprio evento. “Instituições públicas e outros segmentos da sociedade tomaram a decisão de construir um amplo debate junto à comunidade atendida pelos câmpus, no intuito de entender, problematizar e propor alternativas e soluções para a dinâmica das águas urbanas”, justificou. Ao longo dos dias, foram realizadas atividades, como oficinas, palestras, minicursos e visitações in loco de determinadas áreas, para levar conhecimento à comunidade e prepará-la para o debate.
Marcos Schliewe, doutor em Botânica e professor do Câmpus Formosa, apresentou a contextualização do tema da audiência. A contestação teve início com servidores do IFG e UEG, que, juntos, analisaram irregularidades e imprecisões no projeto de canalização do Joséfa Gomes elaborado por empresa terceirizada, contratada pela Prefeitura Municipal de Formosa. Após análises pelo grupo, foi construído um documento abordando as falhas do projeto, contendo argumentos técnicos, em seguida, encaminhado à promotoria pública. “O último passo é esta audiência pública, que, além de apresentar as informações, deseja que a comunidade se expresse e tire as suas dúvidas”, explicou o professor Marcos.
Schliewe resumiu o que se escutou nas atividades durante a Semana Nacional do Meio Ambiente do IFG: “Canalização de córrego é do século passado. Desde 1970 tem pesquisadores dizendo que a canalização não resolve problema de inundação”.
Marcos apresentou histórico de notícias nacionais sobre canalização de córregos e rios, e pesquisas realizadas no Câmpus Formosa relacionadas à bacia do Córrego Joséfa Gomes. Muitas delas já apresentavam problemas relativos à sustentabilidade. A preocupação ambiental do IFG com a localidade não parou na pesquisa, mas se ampliou no ensino, com aulas externas ministradas na cidade, e na extensão, com eventos relacionados. “Há muito tempo estamos falando do problema. A gente precisa se fazer ouvir, e nós, pesquisadores, precisamos da ajuda de toda a comunidade para que estes argumentos venham à tona para todos”, disse. “A gente trabalha com tecnologia, e tecnologia social. Não é tecnologia que gasta dinheiro e é ineficiente, como este projeto de 32 milhões de reais”, refletiu o biólogo.
Dentre as soluções apontadas nas atividades do evento, Schliewe relembrou algumas: desenvolvimento de projeto a médio e longo prazo das águas pluviais, incentivo fiscal para proprietários que não tiverem todo o seu lote acimentado, plano de gestão e execução de coleta de resíduos sólidos.
Democracia e estudo socieconômico
“A partir da minha experiência nos trabalhos de licenciamento, de usinas, de mineradoras, não é possível discutir um ambiente desconsiderando a dimensão social da implementação de obras de engenharia”, refletiu o geógrafo Wilson Lopes Mendonça Neto.
O professor Wilson, professor e geógrafo da UEG, doutor pela Universidade Federal de Goiás (UFG) e especialista em planejamento ambiental, por sua vez, focalizou problemas no projeto, dentre eles, os relacionados à escuta da população e ao diagnóstico do meio socioeconômico do córrego. O geógrafo afirmou que “a gestão pública considera o ambiente algo externo à sociedade e ao cidadão, uma visão que coisifica o recurso hídrico, como o Joséfa Gomes”. Segundo ele, “não houve esforço de diálogo com a sociedade” e o projeto não contemplou “a dimensão socioeconômica do entorno do córrego”.
Alagamentos urbanos
Para o também geógrafo e profundo conhecedor de recursos hídricos, Elton Souza Oliveira, a ocupação urbana faz com que haja interferência no funcionamento hidrológico da bacia. A lógica é: quanto menos impermeabilização de terrenos, mais infiltração no solo e menos inundações. “O problema da água não está na água. O problema está fora. O problema é o uso e a ocupação do solo”, definiu.
“As instituições de ensino e pesquisa que existem neste município estão constantemente pesquisando e trabalhando com isso. O que falta é o interesse do poder público”, declarou o pesquisador Elton Souza Oliveira.
A falta de dados também foi citada pelo professor. “Não consta no projeto metodologia para levantamento, estudo de mobilidade urbana, impactos na área jusante da canalização”, citou, ele.
Questões jurídicas
O promotor da 2ª Promotoria de Justiça de Formosa, Ramiro C. Martins Neto, fechou as falas dos palestrantes, expondo o ponto de vista jurídico sob o caso. Antes, relatou os últimos fatos em que a promotoria pública se fez presente e questionou a falta da participação das instituições superiores públicas de ensino e pesquisa. “Se tenho na minha cidade dois institutos de excelência, como a UEG e o IFG, e eu não me dou ao trabalho de convidar para uma audiência pública, soa estranho”, declarou o promotor. Ramiro falou de etapas do processo jurídico, questionou a ata da audiência e relatou a urgência por parte do poder público em dar celeridade ao processo.“Há um censo de urgência deste projeto fora do comum”, comentou.
O promotor apontou problemas no projeto observados pela Promotoria: construção em área de APP, impermeabilização do solo, concretagem de canal, canalização parcial e inexistência de outra medida de drenagem urbana. “É claro que me importo com o dinheiro público. Além de todas as preocupações relatadas pelos professores no atendimento que a gente fez, claro que tenho a preocupação da gestão do dinheiro público federal que vem para Formosa versus a pressa em executar este projeto, mas me preocupo também com os projetos e estudos que ficaram ‘para depois’”, "como o Plano de Resíduos Sólidos, que ficará para depois", conforme informado na audiência pública.
"É muito difícil sensibilizar as pessoas para este tipo de problema”, concluiu o promotor.
O jurista revelou que solicitará uma perícia para o órgão que presta apoio técnico para o Ministério Público, localizado em Goiânia, a CATEP/MPGO, pedindo “que analise não só o projeto em si, mas a própria ideia de canalização do ponto de vista socioambiental”. A 2ª Promotoria de Justiça acompanha o projeto por meio de procedimento administrativo. Após as falas, o espaço foi aberto aos presentes, que expuseram seus pontos de vista e questionamentos, para futuras ações e para o próprio embasamento da contestação.
Coordenação de Comunicação Social/Câmpus Formosa
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