Estudo do Câmpus Goiânia mostra insegurança para pedestres em ruas da Capital
Nota técnica traz mais de 40 pontos em ruas e avenidas das regiões central e sul em que pedestre corre risco ao fazer travessias devido à falta de infraestrutura, sinalização e planejamento
Levantamento realizado pelo professor área de Transporte do Câmpus Goiânia do Instituto Federal de Goiás (IFG) e coordenador do curso técnico em Transporte Rodoviário na modalidade educação de jovens e adultos, Marcos Rothen, mostra insegurança de pedestres em 44 pontos das regiões central e sul de Goiânia. As informações estão na nota técnica de novembro deste ano elaborada pelo docente. Dentre os locais abordados, o estudo cita vários locais de risco em avenidas como 85, S1, Jamel Cecílio, Leste Oeste, T-63, entre outros.
A nota faz parte de pesquisa que, segundo o professor, deve ser finalizada em março de 2022 e trata sobre a adaptação da literatura técnica internacional sobre a mobilidade urbana e as possíveis aplicações em Goiânia. O estudo conclui que dos 44 locais analisados, 98% apresentaram locais de risco para os pedestres. Em 59% deles, o pedestre precisa correr ou acelerar o passo para poder efetuar a travessia com segurança. E ainda: 75% dos casos apontados foram observados em outros locais da Capital, mas que não foram citados no estudo, por estarem em local fora da área de foco da análise.
O levantamento mostra que em várias vias da cidade, o pedestre não foi considerado no momento do planejamento urbano, levando-o a situações de risco devido à falta de barreiras e de sinalização (ou sinalização insuficiente) que o obriguem a fazer a travessia em local seguro. Para a conclusão da pesquisa, a nota técnica leva em consideração bibliografia internacional sobre mobilidade, como o Signal Timing Manual (2015), além do Código Brasileiro de Trânsito, no qual se prevê a obrigatoriedade de que os movimentos de travessias sejam seguros para os pedestres, mesmo que isso lhes causem algum desconforto.
Pedestres se arriscam em travessia em local sem sinalização e sem barreira de contenção para sua segurança na Avenida Jamel Cecílio
De acordo com Rothen, a escolha dos locais para análise teve como critério a intensa movimentação de pedestres e veículos. “Muitas vezes saía andando em busca de algum lugar que já tinha conhecimento e onde via um pedestre correndo, parava para verificar os problemas”, comenta. Além da análise bibliográfica, a pesquisa foi realizada com base em registros feitos in loco que mostram a dificuldade das pessoas ao se deslocarem a pé nas ruas de Goiânia.
“Também selecionei os lugares onde foram implantadas algumas obras, como o viaduto da Jamel Cecílio, o da Leste Oeste e o BRT da Avenida 90. Nesses novos locais é flagrante que o pedestre não foi considerado no projeto. Mesmo o do BRT, só foi visado o aumento da velocidade dos carros, o que nenhuma metrópole do mundo faz. Paris agora na área central o limite é de 30 e São Paulo, mesmo nas avenidas, o limite é de 50 km”, explica o professor.
No caso do viaduto da Avenida Jamel Cecílio, a nota aponta que não há previsão de local de travessia para os pedestres. As características relatadas no local são o intenso volume de veículos com liberdade para atingirem velocidades elevadas e uso do solo intensivo nos dois lados da via. Neste caso, segundo o professor, foi observado que os pedestres acabam procurando brechas no fluxo dos carros, criadas pelos semáforos, e se arriscam na travessia. O mesmo é observado no trecho da Avenida Leste Oeste, localizado próximo à região da Rua 44, no Setor Central. Nesse ponto em específico, o professor chama a atenção para o grande número de pedestres por ser uma área de concentração comercial.
Ainda em vias com viadutos, o estudo relata a falta de opção para o pedestre, assim como ocorre também em saídas e entradas para “obras de arte”, como a que está localizada no encontro das Avenidas 85 e S1, no Setor Serrinha. A pesquisa mostra que viadutos e trincheiras buscam dar maior fluidez aos veículos, mas não programam brechas para que os pedestres atravessem. Tal travessia ocorre entre os veículos.
Sem faixa ou sinalização, pedestre se arrisca em brechas entre veículos na avenida S-1, Setor Serrinha
Outro ponto que a pesquisa salienta são as rotatórias, sejam elas de grande ou pequeno porte. Na Praça Ciro Lisita, no Setor Coimbra, por exemplo, o pesquisador conseguiu flagrar pedestres entre os carros, com o intuito de chegar ao outro lado da via ou até mesmo para ir até a praça, que funciona como uma rotatória. No local, há quatro entradas e quatro saídas de veículos, mostrando a preferência para condutores. Já o pedestre, como foi relatado na nota técnica, busca oportunidade de passagem entre os carros, aguardando brechas ocasionadas pelos semáforos situados ao longo da avenida, e normalmente procuram lugares mais estreitos na via para efetuarem a travessia.
O estudo revela também que, mesmo quando há sinalização, como faixas de pedestres ou semáforos que priorizem os transeuntes, ainda assim há risco. Um exemplo é em uma das faixas na Avenida T-63, que possui um canteiro central para dividir os fluxos. Nela foi constatado que, em determinados momentos, o movimento de veículos em um dos sentidos é interrompido por um semáforo enquanto o fluxo paralelo de sentido contrário ainda continua. “Tal situação causa confusão também nos fluxos que cruzam a avenida e para os pedestres que nem sempre percebem esse tipo de situação que não é normal em outras cidades. Não há informação ao pedestre que essa situação peculiar existe”, explica o professor.
Sem barreira de proteção e informação sobre onde fazer a travessia, pedestre aguarda fluxo de carro conseguir checar ao outro lado da Avenida Paranaíba
Na Avenida Paranaíba, Setor Central, o docente conseguiu outro registro em que um pedestre atravessa uma parte da via e aguarda para poder cruzar a outra parte da rua, uma vez que há fluxo distinto nos dois lados da pista. No local não há canteiro de segurança ao pedestre. Nesse exemplo, o estudo relata que: o local dedicado para os pedestres efetuarem a travessia nem sempre é facilmente identificado; a travessia normalmente é feita em duas etapas; e os veículos, nesses locais, já atingiram uma velocidade maior e, muitas vezes, acima dos limites regulamentados.
No cruzamento das avenidas Paranaíba e Araguaia, observou-se que há focos para pedestres que garantem sua segurança, porém não há proteção adequada enquanto se aguarda para fazer a travessia, já que há fluxos de veículos em vários sentidos. Segundo o estudo, ainda falta informação para o pedestre de que a travessia deve ser efetuada em duas etapas.
No cruzamento das avenidas T-4 e T-63, no Setor Bueno, o pesquisador constatou a presença da faixa de pedestre, porém, o canteiro central que divide os fluxos das avenidas não se estende até a sinalização na rua, obrigando a exposição do pedestre. No local, encontram-se pequenas bolas de concreto, chamadas de “bolotas” pelo estudo, que obrigam o pedestre a fazer desvios e inviabiliza a passagem de cadeiras de rodas e de pedestres com limitação de mobilidade. “Goiânia não oferece condições para que os deficientes tenham segurança e conforto para andarem pela cidade. Dificilmente vemos um deficiente visual ou um cadeirante andando pela cidade, mesmo os idosos pouco se locomovem. Na literatura que consulto eles dão atenção aos PNE, pois fazem parte da sociedade. Me chamou a atenção que mesmo próximo a região que tem muitos hospitais não há espaço, por exemplo, para os idosos. Mas em algumas situações, o idoso vem andando com dificuldade e, quando chega no local de travessia, ele faz um esforço para dar uma corrida. Sem dúvida essas pessoas não são lembradas pelas autoridades”, salienta Rothen.
Obstáculos dificultam a locomoção de pedestres e cadeirantes, além de não oferecerem local seguro para o usuário que aguarda a travessia feita em dois tempos
Confira outros pontos de alerta que estão na nota técnica:
- Faixa de pedestre implantada em vias com canteiro central e sem proteção intermediária (Av.T2 com Rua T49, Av.T2 com Rua T49 - Setor - Setor Bueno; Avenida Paranaíba - Setor Central);
- Mini-rotatórias e rotatórias de grande porte sem espaço para os pedestres (Rua T30, com Rua T49 - Setor Bueno e Praça Ciro Lisita - Setor Coimbra);
- Ausência de calçadas no entorno dos posto de abastecimento de combustível (Av. T63 com Av. T5 no Setor Bueno);
- Uso de fases distintas em avenidas com pistas separadas por canteiro central (Av. T63 - Setor Bueno);
- Falta de canalização para os veículos e local para travessia dos pedestres (Praça Nova Suíça);
- Falta de obstáculos direcionadores para os pedestres não efetuarem a travessia em sinal de risco (Av. Paranaíba - Setor Central);
- Travessia em duas etapas - falta proteção adequada e informação (Av. Araguaia com Av. Paranaíba - Setor Central);
- Cruzamento semaforizado sem focos em todos os locais onde há faixa de pedestres (Av. Paranaíba com Av. Tocantins - Setor Central);
- Avenida larga em sentido único exigindo travessia em uma fase (Av. Tocantins com Av. Anhanguera - Setor Central);
- Saída de pedestres de pólo gerador em local de retorno sem proteção nas travessias próximas (Av. Paranaíba com Av. Goiás - Setor Central);
- Local da travessia de pedestre está obstruído por objeto urbano artificial (Av. T-7 com Av. T-1- Setor Bueno);
- Local de intensa travessia de pedestres sem proteção (Conflito com os veículos que convergem a direita, sem visibilidade segura) (Av. T-1 com Av. T-7 - Setor Bueno);
- Obras que interrompem momentaneamente o tráfego nas calçadas (Av. Portugal - Setor Oeste);
- Obras de longa duração e que interrompem as condições adequadas para o trânsito de pedestres (Av. Goiás - Setor Central);
- Cruzamento complexo com várias ruas/faixas de entrada e saída de veículos (Av. T-2 com Av. T-10 - Setor Bueno);
- Faixa de pedestre sem continuidades na calçada (Av. T-3 com Av. T-5 - Setor Bueno);
- Faixa em via de mão dupla com intenso movimento de veículos e sem proteção para pedestre (Av. T-10 - Setor Bueno);
- Cruzamentos semaforizados em corredores de transporte e sem focos para pedestres nas travessias (Av. 85, Av T-10 - Setor Bueno);
- Descontinuidade do caminho para os pedestres em avenida com intenso fluxo de pessoas (Av. T-11 com Av. 85 - Setor Bueno);
- Pontos de ônibus dissociados dos locais de travessia em corredor de transporte (via com canteiro central) (Av. 85 - Setor Bueno);
- Movimentos conflitante em uma mesma fase (pedestres e veículos) (Av. T-30 com Av. T-9 - Setor Bueno);
- Longo trecho de Avenida em área central sem travessias para pedestres (Av. Paranaíba - Setor Central);
- Praça sem acessos seguros (Rua T-30 com Rua 55 - Setor Bueno);
- Calçada reduzida para abrir espaço para estacionamento de veículos (Av. T-63 - Setor Bueno);
- Placa de advertência associada à faixa de pedestre (Av. S-1 - Setor Serrinha);
- Falta de canalização de fluxos de veículos (Rua T-30 - Setor Bueno);
- Cruzamento de larga extensão sem separação (Av. T-63 com Av. Couto Magalhães - Setor Pedro Ludovico);
- Falta de manutenção de botoeira (Av. Laudelino Gomes - Setor Bela Vista);
- Obras liberadas para o tráfego sem início da operação de controle (Av. 90 e Av. 136);
- Ponte em área de expansão urbana entregue sem tratamento para pedestre (Avenida dos Alpes - Jardim Europa);
- Avenida com conversão à esquerda controlada e fluxo direito livre (Av. D - Setor Marista);
- Trecho complexo com fluxo intenso, situado em corredor de ônibus (Av. 85 com Rua 106 - Setor Sul);
- Ponto de ônibus em corredor distante do ponto de travessia (via sem canteiro central) (Av. 85 - Setor Sul);
- Faixas de pedestre contíguas (Av. 85 - Setor Bueno);
- Falta de faixa de pedestre, local com foco e de acesso a importante polo gerador de tráfego (Rua T-15 - Setor Bueno);
- Semáforo com fase exclusiva para pedestre em interseção com volume eventual de pedestre (Av. Contorno - Setor Central)
Pedestre se arrisca entre carros na Rua T-30
Comparação
A pesquisa traz também exemplos praticados em cidades europeias que seguem as normas estabelecidas pela literatura em relação à segurança de pedestres em vias urbanas, como forma de comparar com o que é praticado em Goiânia. Um dos casos é a travessia com sinalização e proteção em Treno, na Itália. Há também o modelo de proteção para o pedestre em travessia de avenidas de duplo sentido e a canalização dos transeuntes e informação sobre travessia em dois tempos, ambos em Paris.
Para Marcos Rothen, o estudo tem o objetivo de alertar as autoridades sobre a necessidade de preservar o cidadão, seja ele local ou visitante, que precisa se deslocar a pé. “Goiânia é uma cidade que se tornou uma metrópole e não se deu conta disso, o carro é uma prioridade nem sempre justificada. Sempre procuro divulgar para a sociedade os resultados que encontro nos meus projetos de pesquisa, entendo isso como uma forma de extensão e do IFG contribuir para melhoria da nossa região”, completa o professor.
Nesse estudo, o docente coletou dados entre os meses de outubro e novembro, contando com a colaboração de estudantes do Bacharelado em Engenharia de Transportes e do curso técnico em Transporte Rodoviário do câmpus.
Coordenação de Comunicação Social do Câmpus Goiânia do IFG.
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